Por tratar de forma descortês vítimas de violência doméstica e influenciar na
vontade de cada uma induzindo-as à desistência dos processos, o juiz Roberto
Andrés Itzcovich, da 3ª Vara da Comarca de Barcarena, no Pará, recebeu pena de
censura pelo Tribunal de Justiça do estado. O juiz ainda foi condenado por
negligência, por não promover sessão do Tribunal do Júri durante três anos.
Itzcovich ainda foi acusado de causar constrangimento às vítimas de violência
doméstica por reunir todas ao mesmo tempo em um único ambiente para esclarecer
os termos da Lei Maria da Penha e as consequências de dar prosseguimento às
ações. Mas, ao analisar essa acusação, o Pleno do TJ-PA constatou que não houve
violação.
De acordo com o Pleno, não há “inviolabilidade da vida privada das ofendidas
até porque as explicações coletivas e/ou genéricas, sem adentrar no mérito da
causa, feitas antes da denúncia e da formalização da ação penal, não se
confundem com a audiência individual que ele efetivamente realizava do caso
perante o representante ministerial”.
Porém, ao analisar os autos, o relator do processo disciplinar, desembargador
Leonam Godim da Cruz Junior, afirmou que nessas reuniões de esclarecimento o
juiz violou o artigo 3º do Código de Ética da Magistratura, que diz: “A
atividade judicial deve desenvolver-se de modo a garantir e fomentar a dignidade
da pessoa humana, objetivando assegurar e promover a solidariedade e a justiça
na relação entre as pessoas”.
De acordo com o processo, durante as audiências preliminares, o juiz sugeria
às vítimas a desistência da ação. Segundo o depoimento da promota de Justiça
Vyllya Costa Barra Sereni, que acompanhou uma dessas audiências, o juiz, ao sair
da sala de audiência, passou a conversar com algumas mulheres que estavam no
corredor, afirmando que as ações não iam dar em nada e que elas deveriam
desistir. Outro depoente confirmou o relato, afirmando também que o juiz se
dirigia às vítimas dizendo que elas poderiam desistir do processo, não
representando contra o agressor. Segundo o depoente, após o juiz sugerir a
desistência do processo, quase a totalidade das vítimas desistiam.
“É possível constatar a inobservância do artigo 3º do Código de Ética da
Magistratura Nacional, pelo juiz processado, na condução da audiência com as
vítimas de violência doméstica, de certa forma influenciando as ofendidas à
renúncia do direito de ação, maculando o princípio da autonomia da vontade que,
em linhas gerais, é o poder dos indivíduos de suscitar, mediante manifestação de
vontade, efeitos reconhecidos e tutelados pela ordem jurídica”, concluiu o
relator Leonam Godim da Cruz Junior.
Negligência
No Procedimento Administrativo Disciplinar, o juiz Roberto Andrés Itzcovich
foi acusado de não promover sessões do Tribunal do Júri na comarca durante três
anos. O juiz se defendeu alegando que a falta de sessões começou antes de ele
assumir a titularidade da Vara. Ele juntou documentos comprovando que, por
exemplo, de 2000 a 2006, não houve uma única sessão.
Para o desembargador relator, “tal circunstância relativa aos anos anteriores
sem sessão do júri não afasta a responsabilidade do magistrado requerido de seu
múnus; vez que as atribuições genéricas da função são individualizadas por cada
um dos membros do poder jurisdicional, dentro de seu controle subjetivo de
praticar os atos, de forma que não estamos julgando a responsabilidade dos
outros magistrados que passaram na vara sem reunir o Conselho de Sentença, mas
do processado”.
Além disso, o juiz, em sua defesa, alegou que a falta de sessões desde que
assumiu a Vara ocorreu em razão do período eleitoral e da precária estrutura
física da sala do fórum destinada às sessões. Segundo Itzcovich, as sessões só
puderam voltar a ser feitas após uma reforma no local.
Contudo, documentos apresentados por membros do Ministério Público mostram
que a revogação das sessões de julgamento pelo Tribunal do Júri “teve como
justificativa a necessidade de serviço e/ou atualização dos endereços dos réus
pelo Ministério Público, sem que fosse pela precária estrutura física do salão
do Tribunal do Júri ou quaisquer outros casos de força maior”.
Diante do caso, o desembargador relator concluiu ser “indiscutível a
reiterada negligência do processado no cumprimento do dever, por ter deixado de
realizar sessões do Tribunal do Júri durante aproximadamente três anos depois de
assumir a titularidade da 3ª Vara Penal da Comarca de Barcarena; assim como, o
seu procedimento incorreto no exercício da função judicial referente a sua
conduta na reunião com as vítimas de violência doméstica, merecendo a devida
censura”. A maioria do Pleno da corte, no entanto, não concordou com o
entendimento e afastou a punição do juiz nesse quesito.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 4 de maio de 2013
Publicado em MeirinhoMor.Of por RUI R. RAMOS
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