sexta-feira, 31 de agosto de 2012

JUSTIÇA CONDENA O ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE A PAGAR INDENIZAÇÃO DE TRANSPORTE AOS OFICIAIS DE JUSTIÇA

Processo nº 0000960-23.2012.8.20.0124

EMENTA: ADMINISTRATIVO. COBRANÇA. INDENIZAÇÃO DE TRANSPORTE. OFICIAL DE JUSTIÇA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADUAL. LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL Nº 426/2010. INADIMPLÊNCIA POR FALTA DE RECURSOS. IMPOSSIBILIDADE. VERBA INDENIZATÓRIA. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. EXCLUSÃO DO MÊS QUE A AUTORA RECEBEU A VERBA. PROCEDÊNCIA PARCIAL DO PEDIDO. 

A indenização de transporte caracteriza-se como vantagem pecuniária de natureza indenizatória, de modo a não restar submetida ao ditame do artigo 169 da Constituição Federal e, por conseguinte, ao preceituado pelos artigos 14 a 22 da Lei Complementar nº 101/2000, de modo a se impor a procedência do pleito de sua cobrança, em atenção ao princípio da legalidade.

I. Dispensado o relatório, nos termos do artigo 38, caput, da Lei nº 9.099/95 e do artigo 27 da Lei nº 12.153/09. O SERVIDOR xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx, qualificado na petição inicial de fls. 02/05, ajuizou pessoalmente ação ordinária de cobrança em desfavor do Estado do Rio Grande do Norte, igualmente individualizado na referida peça. Requereu a condenação do demandado ao pagamento da quantia de R$ 5.392,15 (cinco mil e trezentos e noventa e dois reais e quinze centavos). Para tanto, afirmou que: 
A) na qualidade de servidor do Poder Judiciário do Rio Grande do Norte, faz jus ao recebimento de indenização de transporte, conforme artigo 4º da Lei Complementar Estadual nº 426/2010; 
B) os valores devidos pelo Estado correspondem a 10% (dez por cento) do vencimento máximo, nos meses de maio a setembro de 2010 e de 15% (quinze por cento) do vencimento máximo, nos meses de outubro a dezembro, também de 2010; 
C) o vencimento máximo do cargo de oficial de justiça é de R$ 5.493,81 (cinco mil e quatrocentos e noventa e três reais e oitenta e um centavos), no período de maio a setembro de 2010, e de R$ 5.878,38 (cinco mil e oitocentos e setenta e oito reais e trinta e oito centavos), a partir de outubro de 2010; 
D) a Indenização de Transporte, ou seja, 15% (quinze por cento) desse valor corresponde a R$ 549,38 (quinhentos e quarenta e nove reais e trinta e oito centavos) e R$ 881,75 (oitocentos e oitenta e um reais e setenta e cinco centavos), respectivamente a cada período. Apresentou a documentação de fls. 06/10. Resultou infrutífera a audiência conciliatória realizada (fls. 18). Em sua contestação de fls. 19/21, o requerido postulou a improcedência do pleito inaugural, sob o argumento de se encontrar no limite prudencial de suas despesas com servidores previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal. Salientou que o acolhimento do pedido afrontaria os artigos 167 e 169, §1º, da Constituição Federal e os artigos 16, 17, § 1º, 21 e 24 da Lei Complementar Federal nº 101/2000. Expostos os contornos da lide, impõe-se a sua imediata resolução. Adequa-se o feito à hipótese do artigo 330, I, do Código de Processo Civil, razão pela qual ora se opera o julgamento antecipado da lide. Cinge-se a pretensão autoral à condenação do Estado do Rio Grande do Norte ao pagamento de Indenização de Transporte, no tocante aos meses de maio a dezembro de 2010. A mencionada verba se encontra prevista no artigo 28 da Lei Complementar Estadual nº 242/2002. Eis a sua dicção: 
"Art. 28. Fica assegurada aos servidores ocupantes do cargo de Oficial de Justiça a Gratificação de Transporte, no percentual de 40% (quarenta por cento) sobre o vencimento básico, conforme prevê o art. 4º, da Lei nº 6.290, de 25 de maio de 1992. 
Parágrafo único. A gratificação a que se refere este artigo não será devida quando o servidor estiver afastado das atividades específicas do seu cargo". 
Tal dispositivo passou a vigorar com a seguinte redação, dada pelo art. 4º da Lei Complementar nº 462, de 08.06.2010: 
"Art. 4° O artigo 28, caput e parágrafo único da Lei Complementar nº 242, de 10 de julho de 2002, passa a vigorar com a seguinte redação: 
Art. 28. Ficam asseguradas aos servidores ocupantes do cargo de Oficial de Justiça, uma Gratificação de Atividade Externa - GAE - no percentual de 50% (cinquenta por cento) incidente sobre o vencimento do respectivo padrão em que estiver situado e uma Indenização de Transporte num percentual de 15% do vencimento máximo (padrão 10) da mesma carreira. 
§1º. A GAE é devida em caráter permanente, integrando a remuneração nos meses de férias e das licenças previstas em lei como remuneradas, sendo computada para fins de cálculos dos proventos de aposentadoria e disponibilidade, devendo sobre ela incidir contribuição previdenciária;
§2º. É vedada a percepção de qualquer uma das duas vantagens previstas neste artigo pelo servidor designado para o exercício de função comissionada ou nomeado para cargo em comissão;
§3º. A Indenização de Transporte não será devida quando o servidor, por qualquer motivo, estiver afastado das atribuições que exijam deslocamento. 
O artigo 5º, inciso III, da mesma Lei Complementar nº 462/2010 prevê: 
Art. 5º A diferença entre o vencimento de todos os cargos efetivos do Poder Judiciário, fixado por esta Lei Complementar, e o decorrente da Lei Complementar nº 242/2002, alterado pela Lei Complementar de nº 372, de 19 de novembro de 2008, será implementada em parcelas, de forma cumulativa, observada a seguinte razão: 
(...) III - no que tange à indenização de transporte, modificada pelo artigo 4º desta lei, o total de 15% (quinze por cento) será introduzido em duas prestações, a primeira delas de 10% (dez por cento), a partir de 1º de maio de 2010, e a segunda de 5% (cinco por cento) a partir de 1º de outubro de 2010. Os documentos de fls. 06/10 informam que o peticionário ocupava o cargo de Oficial de Justiça do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte no lapso temporal apontado supra, tornando indubitável a sua condição de destinatário da pecúnia em foco, à luz do invocado ditame legal. Observa-se a ausência da verba perseguida nos contracheques referentes a esse intervalo, salvo em maio de 2010 (fls. 06). Não houve, a propósito, discussão pelo demandado a respeito da constitucionalidade do respectivo diploma, tampouco quanto à falta do pagamento noticiada na inicial. Cingiu-se, em sua contestação, a assinalar que o pagamento ora reivindicado não chegou a se consumar por falta de recursos. Asseverou, outrossim, esbarrar o intento sob exame nas disposições dos artigos 167 e 169, § 1º, da Constituição Federal e dos artigos 16, 17, § 1º, 21 e 24 da Lei Complementar Federal nº 101/2000. Sob essa perspectiva, não bastasse a eloqüente demonstração da ausência de pagamento da verba em comento no intervalo descrito na proemial, pela via dos aludidos contracheques, tem-se como incontroversa a inadimplência estatal narrada na vestibular, depreensão escorada na locução do artigo 319 do Código de Processo Civil, dada a inaplicabilidade no caso vertente das disposições dos artigos 302, I, e 320, II, ambos do invocado diploma. Nesse horizonte, não se deve olvidar de que a pretensão em análise se reporta a interesse público secundário e, por conseguinte, disponível. Não discrepa desse pensamento o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, consoante se verifica do seguinte excerto do Acórdão proferido nos autos da Apelação Cível de número 2005.71.00.002266-6/RS, datado de 4 de fevereiro de 2009: 
"(...) Sob esse aspecto, bem salientou Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero, em sua obra Código de Processo Civil Comentado Artigo por Artigo , São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 314, in verbis: "São exemplos de direitos indisponíveis os direitos referentes ao estado da pessoa, os direitos de personalidade (art. 11 do CC) e os direitos da Fazenda Pública que têm por base o interesse público primário. Observe-se: nem todo direito titularizado pela Fazenda Pública é indisponível. Só há indisponibilidade se há interesse público primário à base. O interesse público pode ser dividido em interesse público primário (bem comum) e interesse público secundário (interesse da pessoa administrativa). O direito da Fazenda Pública fundado em interesse público secundário é disponível." (...)" (grifos introduzidos) Perfilha essa intelecção o Tribunal de Justiça catarinense, no Agravo de Instrumento 528189 SC 2009.05818-9, ao invocar julgamento do Supremo Tribunal Federal acerca do mote: "(...) Assim, em virtude da necessidade do tratamento, uma vez demonstrada ser indispensável ao paciente, além de comprovados os requisitos da hipossuficiência, deve o medicamento solicitado ser fornecido gratuitamente pelo Estado, entendendo-se este em todos os seus níveis - federal, estadual e municipal, mesmo porque "Entre proteger a inviolabilidade do direito à vida, que se qualifica como direito subjetivo inalienável assegurado pela própria Constituição da República (art. 5, caput), ou fazer prevalecer, contra essa prerrogativa fundamental, um interesse financeiro e secundário do Estado, entendo - uma vez configurado esse dilema, que razões de ordem ético-jurídica impõem ao julgador uma só é possível opção: o respeito indeclinável à vida". (PETMC 1246/SC, Min. Celso de Mello). (...)" (grifos introduzidos).

Ultimadas essas ponderações, impõe-se a incursão no terreno da indigitada argumentação formulada pela parte ré. Nota-se, em âmbito preambular, não se caracterizar a alegada indisponibilidade de recursos como causa extintiva de obrigação de pagamento instituída por lei em plena vigência, como se detecta no presente caso. Neste sentido já decidiu o Superior Tribunal de Justiça: 
"RECURSO ESPECIAL Nº 542.133 - SC (2003/0090692-1) EMENTA PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. REVISAO DO PERCENTUAL. ANÁLISE DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N.º 07 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. ANÁLISE DE DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. IMPOSSIBILIDADE NA VIA DO ESPECIAL. MATÉRIA INSERTA NOS ARTS. 1. E 2.º-A DA LEI N.º 9.494/97; NO ART. 1.º, 3.º, DA LEI N.º 8.437/92; NOS ARTS. 273 E 475, INCISO II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N.º 211 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. AUXÍLIO-ALIMENTAÇAO. LEI N.º 8.460/92. LIMITAÇAO DE DESPESAS COM PESSOAL. INAPLICABILIDADE. EFICÁCIA DA LEI FEDERAL GARANTIDA. SINDICATO. DIREITO DE FILIADOS RELACIONADOS. REGIME DE REPRESENTAÇAO. INEXISTÊNCIA DE DIREITO COLETIVO. COISA JULGADA INTER PARTES. (...) 3. Restrições orçamentárias e fixação de limites para as de despesas com pessoal dos entes públicos, não podem servir de fundamentos para elidir o direito de servidores públicos a vantagens ou aumentos assegurados por lei. Precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça. (...)" (grifos introduzidos).
Noutro ângulo, segundo o discurso do contestante, erigem-se em óbice ao desiderato da parte autora as locuções dos artigos 167 e 169, § 1º, da Constituição Federal e os mandamentos dos artigos 16, 17, § 1º, 21 e 24 da Lei Complementar Federal nº 101/2000, por se situar na faixa do limite prudencial de suas despesas com servidores. Nesse campo, não se deve olvidar do teor do artigo 28, § 3º, da Lei Complementar Estadual nº 242/2002, já transcrito: 
"§3º. A Indenização de Transporte não será devida quando o servidor, por qualquer motivo, estiver afastado das atribuições que exijam deslocamento", que evidencia o nítido caráter indenizatório da verba perseguida. Aliás, nem se pode discutir acerca na natureza indenizatória, haja vista que a própria designação da vantagem assim a intitula, "Indenização de Transporte". Curial a ênfase, nesse particular, à inexistência de qualquer pronunciamento do requerido no sentido de obstar a pretensão preludial, sob o argumento do indébito do pleito em pauta, em face do afastamento do peticionário de sua labuta, tarefa que lhe competia, por se tratar de fato impeditivo do direito alegado, conforme as regras de distribuição do ônus probatório. Dimana da inadequação dessa verba ao conceito jurídico-contábil de despesa de pessoal, outrossim, a inaplicabilidade dos comandos plasmados nos artigos 16 a 18 da Lei de Responsabilidade Fiscal e, por conseguinte, nos artigos 21 e 24 desse diploma. Demais disso, não incide sobre a pretensão autoral em análise o ditame do artigo 167 da Carta Magna, considerando-se que nenhuma das hipóteses previstas nesse dispositivo guarda relação com o estipêndio aqui perseguido. Com efeito, a pecúnia sob estudo não deriva de programa ou projeto, tampouco se identifica com a definição de operação de crédito. À luz dessas ponderações, reputa-se a conduta de inadimplência em tela como violadora do cânon constitucional da legalidade, ao qual se encontra a Administração Pública jungida de modo perene. Feitas essas considerações, impõe-se a sondagem atinente à regularidade da quantia pleiteada. Informa o contracheque de fls. 06, referente a maio de 2010, que o acionante percebeu a antiga verba intitulada de Gratificação de Transporte, que foi substituída pela Indenização de Transporte e pela Gratificação de Atividade Externa (GAE), de acordo com a Lei Complementar n. 462/2010, razão pela qual se faz indevido o acolhimento da rogativa inaugural, no concernente ao mês em relevo, sob pena de duplicidade de pagamento de um mesmo título pecuniário. Nessa linha de raciocínio, quanto ao período em que a gratificação era de 10% sobre o vencimento (maio a setembro de 2010), verifica-se fazer o demandante jus à pecúnia referente aos meses de junho a setembro de 2010. No lapso temporal em que a Indenização de Transporte atingiu o valor de 15% (quinze por cento) sobre os vencimentos, o requerente tem direito a essa verba, no tocante aos meses de outubro a dezembro de 2010. Vê-se no teor da Lei nº 426/2010, em atenção ao disposto no seu artigo 6º, o anexo com a tabela de remuneração dos cargos efetivos do Poder Judiciário, segundo a qual, em maio de 2010, o teto remuneratório do servidor de nível superior, de padrão 10 (dez), alcançava a soma de 5.493,81 (cinco mil e quatro centos e noventa e três reais e oitenta e um centavos). Por meio de operação aritmética, atinge-se a conclusão de que 10% (dez por cento) desse valor correspondem a R$ 549,38 (quinhentos e quarenta e nove reais e trinta e oito centavos). Resulta da multiplicação dessa importância pelo número de meses em que a Indenização de Transporte consistia em 10% (dez por cento) do vencimento máximo do servidor, a saber, 4 (quatro), considerando-se o período de junho a setembro de 2010, o valor de R$ 2.197,52 (dois mil e cento e noventa e sete reais e cinquenta e dois centavos). Por sua vez, em outubro, consoante dita tabela, o vencimento máximo do servidor passou para R$ 5.878,38 (cinco mil e oitocentos e setenta e oito reais e trinta e oito centavos). Tem-se que R$ 881,75 (oitocentos e oitenta e um reais e setenta e cinco centavos) correspondem a 15% (quinze por cento) de tal valor. Fazendo jus a essa verba, no concernente aos meses de outubro a dezembro, percebe-se que o valor devido ao peticionário, a esse título, é o de R$ 2.645,25 (dois mil e seiscentos e quarenta e cinco reais e vinte e cinco centavos). No total, o promovente deverá receber R$ 4.842,77 (quatro mil e oitocentos e quarenta e dois reais e setenta e sete centavos). Assinale-se, a propósito, o incremento observado nos vencimentos dos servidores do Poder Judiciário potiguar em outubro de 2010, por meio do artigo 5º da Lei Complementar Estadual de número 426/2010, o qual gerou a elevação do valor da Indenização de Transporte. Culminam essas ponderações na plausibilidade parcial do intento autoral.

II. Ante o expendido, com base no artigo 269, I, do Código de Processo Civil, julgo procedente em parte o pedido e condeno o Estado do Rio Grande do Norte a pagar à parte autora a quantia de R$ 4.842,77 (quatro mil e oitocentos e quarenta e dois reais e setenta e sete centavos), referente à Indenização de Transporte dos meses de junho, julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2010. Sem custas processuais, por força dos artigos 54 e 55 da Lei nº 9.099/95. Sentença não sujeita ao duplo grau de jurisdição obrigatório (Lei nº 12.153/09, artigo 11). Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Certificado o trânsito em julgado desta sentença, arquivem-se os autos com baixa no registro. Parnamirim/RN, 07 de agosto de 2012. Valter Antonio Silva Flor Júnior Juiz de Direito Advogados(s): Magna Letícia de A Lopes Câmara (OAB 1727/RN), Antenor Roberto S. de Medeiros (OAB 1840/RN).

Veja, também, o Processo nº 0001680-87.2012.8.20.0124.

Fonte: Consulta Processual do TJRN
Publicado em MeirinhoMor.Of por RUI RICARDO RAMOS

Nenhum comentário:

Postar um comentário

3 ANOS DE MEIRINHOMOROFICIAL E DE PRESTAÇÃO DE INFORMES AOS OFICIAIS DE JUSTIÇA BRASILEIROS.